O Ministério Público (MP) de São Paulo entrou na Justiça estadual com uma ação civil pública, por improbidade administrativa, contra o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, e três secretários municipais. Eles são acusados de desvio de finalidade no uso do fundo que gere os recursos arrecadados com a aplicação de multas de trânsito na capital paulista. O Ministério Público estima que o prejuízo pode chegar a R$ 617 milhões.
Na ação, os promotores Marcelo Milani e Wilson Ricardo Tafner, do Patrimônio Público e Social, pedem a condenação de todos os envolvidos, o que poderá provocar a perda do cargo, o bloqueio de bens dos acusados, o ressarcimento aos cofres públicos do dinheiro desviado e danos morais difusos de R$ 185 milhões.
Segundo Milani, o Ministério Público decidiu entrar com a ação após ter recebido uma queixa sobre a utilização dos recursos arrecadados com as multas. A queixa foi feita por um cidadão paulistano, em agosto deste ano. A ação se refere ao ano de 2014, quando o valor arrecadado somou R$ 892 milhões, com a aplicação de mais de 10,6 milhões de multas. O promotor informou ainda que a investigação do MP deverá atingir os quatro anos anteriores, pois antes desse períodio a lei determina a perscrição do crime.
De acordo com o promotor, a prefeitura incorreu em dez irregularidades ao usar o dinheiro arrecadado com as multas em funções que não estão previstas pelo Código Brasileiro de Trânsito. O Código determina, por exemplo, que todas as receitas provenientes de multas sejam aplicadas em sinalização de trânsito, na engenharia de tráfego, no policiamento, na fiscalização ou na educação de trânsito.
Segundo Milani, o dinheiro teria sido utilizado, não para propósitos pessoais dos acusados, mas para pagamento, por exemplo, de obras de implantação de terminais de ônibus, no valor de R$ 15 milhões; para pagamento de obras de vias para bicicletas, R$ 25 milhões; no repasse de R$ 571 milhões para despesas operacionais da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET); e para a Guarda Municipal para a aplicação de multas. “Estão usando as multas como se fosse arrecadação paralela”, disse Milani.
Outra irregularidade encontrada pelos promotores, de acordo pelo MP, é o fato de a prefeitura administrar mais de uma conta-corrente para as multas quando, segundo uma lei municipal editada em 2007 (Lei 14.488), deveria usar o Fundo Municipal de Desenvolvimento de Trânsito para a administração desse dinheiro. “Foi dada uma pedalada pela prefeitura”, disse Milani.
O promotor admitiu, no entanto, que as cinco contas-correntes, além do fundo, não foram criadas pela atual administração, mas existem pelo menos desde 2010. Ou seja, a movimentação irregular do dinheiro das multas pode estar ocorrendo na cidade há mais tempo. “Não foi só essa prefeitura que se utilizou disso”, afirmou.
Milani informou que existe outra investigação em curso, semelhante a essa, mas que envolve o governo do estado de São Paulo. “Temos investigação também referente a multas no estado de São Paulo, que é da malha rodoviária estadual. E há uma suspeita que isso também pode estar sendo feito em outras prefeituras do país, usando o dinheiro das multas como fonte de arrecadação”. O promotor não ofereceu mais detalhes sobre essas investigações.
Por meio de nota, a prefeitura de São Paulo disse estranhar que o Ministério Público tenha entrado com a ação “apenas contra essa gestão”. “Para a prefeitura de São Paulo, trata-se de uma questão de compreensão por parte do Ministério Público do que é segurança e educação de trânsito. No entendimento da administração municipal, os recursos foram aplicados corretamente e com transparência, de acordo com o Código Brasileiro de Trânsito e com a Lei Municipal 14.488/2007, o decreto 49.399/2008 e as portarias 1483/08, 163/13, 198/14 e 133/2015 que regulam o Fundo Municipal de Desenvolvimento do Trânsito. Esse padrão foi seguido por todas as administrações anteriores”, diz a prefeitura.