A dona de casa Kelly Braga, de 29 anos, não imaginava que iria descobrir uma rara doença no filho depois de queimar 29% do corpo da criança em um acidente doméstico no banho. Matheus Enrique Braga, de três meses, sofre de hiperinsulinismo congênito, quando o pâncreas produz insulina em excesso, um processo inverso ao da diabetes. Caso não descobrisse a doença a tempo, o menino de Avaré (SP) poderia morrer por paralisação dos órgãos.
“Estava com ele em um dos braços enquanto levava água quente na leiteira com a outra mão. Acabei esbarrando no guarda-roupa antes de chegar à banheira e a água caiu em cima do Matheus. Fiquei péssima, me sentido uma mãe horrível, mas não foi por acaso. Depois que descobrimos a doença, o médico me informou da raridade, que ela atinge uma a cada 50 mil nascimentos”, conta.
O bebê se queimou com apenas 11 dias de vida, em 18 de janeiro. Deu entrada no hospital de Avaré e um dia depois foi levado para a Maternidade Vitória, em São Paulo (SP), onde o pai da criança, Tiago Braga, tem convênio por ser agente penitenciário. Lá ficou internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) um mês em estado grave, já que além da queimadura os sintomas da doença começaram a aparecer.
“Ele não dava sinais de melhoras. Os médicos suspeitavam de uma doença e davam certo remédio, suspeitavam de outra e vinham com outro. Ele ficou todo inchado devido às medicações, chegou ao ponto em que as enfermeiras iriam pegar sangue para exame e ao furarem a pele dele saía água. Podia beber só um pouco de leite, chegava a ficar abrindo a boca desesperado para mamar. Mas o pior foi quando ele sofreu uma parada cardiorrespiratória. Nesse dia ajoelhei clamando a Deus, perguntando se eu estava sendo egoísta demais por querer ele aqui, que Ele levasse o Matheus, mas que não sofresse mais”, descreve.
Descoberta a doença, a crinaça ficou internada por mais um mês se recuperando e tomando o medicamento que controla a insulina, chamado octreoida. Mãe e filho voltaram para casa em 17 deste mês. “Foram dois meses difíceis. Vivendo no hospital, comendo e tomando banho lá, dormindo na cadeira ao lado do Matheus todos os dias. Longe dos meus outros dois filhos, de 7 e 2 anos. Nem mesmo via o sol, já que ficava todo tempo dentro”, conta.
A felicidade da alta entrou em contraste com uma preocupação: como comprar mensalmente o remédio que o bebê precisa? Por isso, dias antes de saírem do hospital, familiares criaram uma campanha no Facebook chamada “Ajude o Matheus” com o objetivo de arrecadar doações para a compra. O medicamento custa R$ 1,8 mil enquanto o salário do pai da criança chega a R$ 1,4 mil, afirma Kelly. “Fiquei muito feliz e surpresa com a contribuição de amigos, parentes e conhecidos, além das orações. Não esperava tantas pessoas colaborando. Quando meu marido me ligou dizendo que tinha conseguido todo dinheiro foi inacreditável”, afirma.
Além das doações, a campanha foi fundamental para que um conhecido advogado levasse o caso à Justiça. O profissional não cobrou nenhuma parte do processo que pediu ao Sistema Único de Saúde (SUS) a liberação do remédio para a família. “O advogado me orientou que o remédio está disponível no SUS apenas para pacientes com gigantismo. Ele apresentou ao juiz o laudo médico dizendo que Matheus precisa do remédio, e a Justiça ordenou a entrega do remédio. O problema é que o médico errou ao prescrever a dosagem, e a caixa que deveria durar um mês dura apenas 15 dias. Meu advogado já entrou pedindo a revisão da receita e vou começar a receber o correto”, diz.
Kelly pretende ainda pedir à Justiça que receba um medicamento canadense em comprimidos, já que o atual é injetável. Enquanto ainda não consegue uma melhora na qualidade de vida da criança, a mãe se contenta em ver as marcas de queimadura nos braços do filho. “Ele é um guerreiro, com tão pouco tempo de vida já sobreviveu a tanta coisa. As cicatrizes são as marcas da vitória dele, uma obra de Deus.”