O coronel reformado do Exército Paulo Malhães, conhecido por sua atuação na repressão política durante a ditadura militar, foi morto dentro de casa, no bairro Ipiranga, na área rural de Nova Iguaçu, Baixada Fluminense, na manhã desta sexta-feira (25). Segundo a Divisão de Homicídios da Baixada, a casa do coronel de 76 anos foi invadida por volta das 13h desta quinta (24). Segundo sua mulher, Cristina Batista Malhães, ela e o caseiro teriam sido feitos reféns até as 22h.
Ainda segunda a viúva, que prestou depoimento, pelo menos três homens participaram da ação, um deles com o rosto coberto. Os criminosos mantiveram as vítimas em cômodos separados e fugiram levando armas que o oficial colecionava e dois computadores.
Segundo policiais, os peritos não encontraram marcas de tiros no local, mas a hipótese de que ele tenha sido baleado não foi descartada. Os agentes buscam imagens de câmeras de segurança que possam auxiliar na identificação da autoria do crime.
O crime ocorre cerca de um mês depois de o militar ter admitido na Comissão Nacional da Verdade que participou de torturas e desaparecimentos durante a ditadura, inclusive o do ex-deputado Rubens Paiva (veja na reportagem ao lado, do Jornal
O local não tem câmeras de segurança, de acordo com o delegado Fábio Salvadoretti, que investiga o caso. A mulher e o caseiro não conseguiram reconhecer os criminosos, mas afirmam não ter sofrido violência física. O corpo de Paulo Malhães foi levado para o Instituto Médico-Legal (IML) de Nova Iguaçu.
O Clube Militar, associação que reúne militares da reserva do Exército, informou que não se pronunciará sobre o caso por não conhecer as circunstâncias da morte do coronel. O chefe de gabinete da presidência da instituição, coronel Figueira Santos, afirmou que o Clube Militar só irá se manifestar se surgir algum "fato novo". O Comando Militar do Leste, no Rio, também informou que não vai comentar o caso, já que as investigações estão a cargo da Polícia Civil.
Em março, em dois depoimentos diferentes, um à Comissão Estadual da Verdade do Rio, no dia 21, e outro na Comissão Nacional da Verdade, dia 25, Paulo Malhães deu detalhes sobre torturas e desaparecimento de corpos durante a ditadura. Primeiro, declarou ter desaparecido com o corpo do ex-deputado Rubens Paiva, morto em 1971. No segundo momento, voltou atrás e afirmou não lembrar se foi ele que executou a ação.
“Eu só disse [à imprensa] que fui eu porque eu acho uma história muito triste, quando a família leva 38 anos dizendo que quer saber o paradeiro. Eu não sou sentimental, não, mas tenho as minhas crises”, justificou, na época.
Presidente do grupo Tortura Nunca Mais, Victória Grabois, considera que o crime demonstra “perigo” para quem investiga a ditadura. “É estarrecedor o que aconteceu. Espero que o Estado brasileiro tome as medidas cabíveis, acione as polícias estadual e Federal para apurarem o que realmente aconteceu. Nós, dos direitos humanos, temos que ficar atentos. Se isso aconteceu com um militar, nós estamos passando por muito perigo”, declarou.
Victória teme que as investigações da Comissão da Verdade sejam prejudicadas devido ao assassinato. “A morte do coronel é uma ameaça, porque outros torturadores podem ficar acuados para prestar depoimentos e esclarecimentos sobre o que aconteceu na época da ditadura militar. Temos que abrir os arquivos da ditadura o quanto antes”, disse.
A Polícia Federal informou que não é atribuição do órgão a apuração desse crime.