Às vésperas do dia “D”, tudo ainda pode acontecer: seja ao longo da semana que antecede o pleito ou durante a carregada e intrincada jornada de votação. Mesmo após a divulgação do resultado oficial das urnas, “surpresas” impactantes podem, até nesse momento, subitamente irromper – conforme os delineamentos e predicados do veredicto final da tempestuosa e acidentada travessia.
Isso porque não se trata, o sufrágio do 2 de outubro de 2022, de uma eleição normal, ordinária, rotineira (comme d’habitude), mas de uma verdadeira e acirrada guerra, de literal e imprevisível confrontação – em fase do atingimento de seu clímax, em pleno ápice do embate terminal.
Há quem aposte num recrudescimento do clima de violência civil; em confrontos de rua; na propagação de escândalos (verdadeiros ou falsos) guardados para a última hora (feito “bala de prata” contra o esconjurado inimigo) – inclusive, até, em fraude eleitoral (como por muitos conjecturado), com manipulação das urnas eletrônicas em favor de candidaturas previamente selecionadas pelo “sistema” (que não aceita mais uma derrota).
Fato é que tudo, decerto, é possível (e factível) no presente e sombroso cenário, a julgar pela agitação exacerbada das narrativas em conflito; pela intolerância ideológica difusa e extremada; pela litigância de má fé inscrita em atitudes frontalmente dissonantes das regras do jogo; mas, sobretudo – o mais grave dentre todos os fatores correntes –, pela profunda crise institucional instalada, há muito, no país, decorrente, primordialmente, da postura facciosa e degenerada do STF e do TSE, em seu ilegítimo e abusivo ativismo judicial e político.
Trata-se de uma conjuntura em que não há mais segurança jurídica alguma, tampouco garantias legais mínimas de proteção e desempenho, abortado, na própria raiz e substância, o prematuro e malogrado Estado de Direito. Um contexto em que até a Constituição de 1988 (outrora dita “Cidadã”) já foi rasgada e estuprada não menos que por aqueles que deveriam ser os seus máximos guardiães – e não os impudicos e aleivosos algozes.
Vive-se, para todos os efeitos, a ditadura da toga, estimulada e pressionada por um sistema oligárquico-patrimonialista (grandes bancos, empreiteiras, grupos de comunicação, narcotráfico, etc., associados a interesses intervencionistas estrangeiros) disposto a cometer todo tipo de crime político para reaver, a qualquer custo, ao preço da ruptura democrática, a posse totalitária do Estado, com o retorno triunfal do arcaico e corrompido regime cleptocrático de antigamente – já devidamente destrinchado, em todas as suas dimensões, pela extinta Operação Lava Jato.
Por isso, censura, perseguições seletivas, difusão de fake News, falsificação das intenções de voto por transviados institutos de pesquisa, fraude eleitoral e, até, cassação de candidaturas ou mandatos (mesmo que a posteriori, sob argumentos falaciosos de “abuso de poder” durante o período eleitoral) poderão figurar como arsenais golpistas de ataque do “sistema”, através de suas “milícias” de frente (engravatadas ou togadas), contra o triunfo de adversários (como no caso de Bolsonaro) que, encarnando a vontade popular, afrontem o convencional status quo, impedindo ao velho establishment o controle absoluto e exclusivo do único obséquio, por este, nessa guerra toda, almejado: as chaves do cofre (e da designação de postos estratégicos) para fins privatistas e “cabulosos”. Simples assim.
Sim, os tradicionais “donos do poder” querem voltar à cena do crime. À fartura e desfrute dos “saudosos” e “vantajosos” (por assim dizer) “tempos imemoriais”, quando tudo era exequível à luz da fanfarronice, da patifaria e da bandidagem – só que agora com mais sede ao pote, sangue nos olhos e desejo de vingança.
As eleições de outubro de 2022, por conseguinte, na moldura desse tortuoso e alarmante quadro, revestem-se da máxima e culminante relevância, pois representam, ao fim e ao cabo, uma luta crucial entre republicanismo e cleptocracia; democracia e ditadura; liberdade e servidão. Uma guerra cujo desenlace definirá, para o bem ou para o mal, o destino dos brasileiros para o restante do século XXI – e para a qual toda a atenção (e concentração) das forças democráticas será determinante e decisiva, nesse round final.
Alex Fiúza de Mello. Professor Titular (aposentado) de Ciência Política da Universidade Federal do Pará (UFPA). Mestre em Ciência Política (UFMG) e Doutor em Ciências Sociais (UNICAMP), com Pós-doutorado em Paris (EHESS) e em Madrid (Cátedra UNESCO/Universidade Politécnica). Reitor da UFPA (2001-2009), membro do Conselho Nacional de Educação (2004-2008) e Secretário de Ciência e Tecnologia do Estado do Pará (2011-2018).
Fonte: Jornal da Cidade Online